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Você é mãe ou pai de cachorro? Então não perca este artigo

Donas de cachorro se divertindo com seu totó.
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Tempo de leitura: 4 minutos

Eles conquistaram nossos sofás e até nossas camas – embora tenham a sua. Ganharam um lugar no banco traseiro dos carros em viagens de família, com direito à mochilinha própria com seus itens de uso corriqueiro (o que pode incluir um agasalho para os dias frios), vão ao médico regularmente e à creche, ganham festa de aniversário (e frequentam outras tantas dos amiguinhos), ocupam nossas conversas rotineiras e também nos preocupam. 

Podíamos tranquilamente estar falando de nossos filhos… ops, mas estamos mesmo. Filhos de quatro patas, em famílias interespécies. Você se identifica? Pois é. O fenômeno de considerar animais de estimação como crianças humanas começou a ganhar popularidade em meados da década passada. Em 2015, o Oxford Dictionary adicionou o termo “fur baby” (bebês de pelos) ao seu léxico oficial, reconhecendo a tendência.

A relação humanos-cães não é simples de ser analisada, e a referida tendência tem muitas camadas de interpretação e efeitos. Mas o fato é que os cachorros estão ocupando um lugar afetivo tão importante e relevante em nossas vidas que transferir-lhes o papel de filhos à primeira vista parece totalmente natural e inofensivo. Será?

Mimar um cachorro é indiscutivelmente melhor do que negligenciá-lo. Mas estamos amando demais? Ou da maneira errada? Estamos, sem querer, prejudicando-os? Não temos a resposta, nem é intenção deste texto fazer julgamento, mas apenas olhar para o fenômeno, assim como a ciência já está fazendo.

Em 2014, cientistas do Hospital Geral de Massachusetts analisaram como importantes estruturas cerebrais são ativadas quando mulheres veem uma imagem de seus filhos ou de seus cachorros. Os resultados mostraram semelhanças – ou seja, no cérebro filhos humanos e filhos de pêlos ficaram equivalentes.

O biólogo Francisco Cabral, mestre em Ciências (USP) e integrante do Laboratório de Etologia, Desenvolvimento e Interação Social do Instituto de Psicologia (USP), cita, por exemplo, o teste da Situação Estranha de Ainsworth, que afere o nível de apego. Inicialmente desenvolvido para ser aplicado com mãe/bebê, o experimento foi adaptado para ser aplicado com tutores e seus cachorros. 

– O teste já foi replicado algumas vezes e permitiu classificar a relação tutor-cachorro como semelhante à observada entre mães/pais e crianças, ou seja, configura- se, de fato, como sendo de apego – explica Francisco, cuja tese de doutorado estuda o apego entre tutores e cães e sua influência na comunicação entre eles.

Como pesquisador, o biólogo optou por esse tema justamente por perceber tutores tratando seus cães como parte da família. 

– Nesse sentido, podemos nos perguntar como esse tratamento pode impactar na qualidade de vida do cão e em como a interação é influenciada de acordo com diferentes tipos de apego – explica ele, que continua: – Atualmente estamos verificando uma nova tendência de também encarar o apego entre humanos e cães como um estilo relacionado à amizade adulta entre humanos. (Confira, no final desse texto, os links para os estudos recentes citados pelo pesquisador.)

Basta pensar na pureza dos cães, na lealdade, na profunda capacidade de nos dar afeto sem cobranças ou críticas para entender como e por que a relação com eles ganha tanto valor na nossa vida. O biólogo lembra ainda o fato de eles permanecerem, mesmo quando adultos, com características de bebês: cabeça grande, olhos expressivos, por exemplo. E isso sabidamente tem impacto na emoção humana (gatilhos para proteger e amar).

Por sua vez, a psicóloga Karen Freitas acrescenta que o vínculo se intensifica em tempos difíceis, como os vividos com a pandemia, sujeitos à ansiedade e depressão. Mas ressalta que é importante observar o grau de dependência emocional, para não causar prejuízos a nenhuma das partes.

– Quando a pessoa está isolada demais, quando não consegue sair sem o bichinho ou se, quando sai, se preocupa em voltar logo para não deixá-lo sozinho… quando o bichinho está inserido em todas as falas do tutor… podem indicar prejuízos nas relações sociais da pessoa – afirma.

A pergunta assustadora e complicada que fica também é: será que meu cão quer ser amado do jeito que eu estou amando? Tratá-lo como filho pode lhe fazer mal?

– Essa é realmente uma pergunta complicada – confessa o biólogo Francisco. – Ainda que no campo afetivo possamos encará-los como nossos filhos ou como bebês, devemos ter em mente que os cães possuem sua própria maneira de enxergar o mundo e de interagir com ele. Não podemos alterar, desmedidamente, suas características “caninas”. Muitas vezes pensamos que as necessidades dos animais não-humanos são muito parecidas com as nossas, e isso não é verdade. Cada espécie possui suas próprias características, que devem ser respeitadas. Caso contrário, podemos afetar negativamente aspectos relacionados à liberdade, ao conforto e à saúde desses animais.

Um cachorro precisa correr, farejar, caçar, interagir com iguais, se sujar… se não conseguirem expressar sua natureza, o bem-estar deles fica a perigo. O antropomorfismo (atribuir ao animal características e sentimentos humanos) exige atenção. Talvez uma forma de ver se há excesso ou não é: em vez de imaginar que seu cachorro é humano, imagine como seria se você fosse o cachorro.

Referências:

Savalli, C., Albuquerque, N., Vasconcellos, A. S., Ramos, D., de Mello, F. T., & Serpell, J. A. (2021). Characteristics associated with behavior problems in Brazilian dogs. Applied Animal Behaviour Science, 234 (October 2020), 105213. https://doi.org/10.1016/j.applanim.2020.105213

Savalli, C., & Mariti, C. (2020). Would the Dog Be a Person’s Child or Best Friend? Revisiting the Dog-Tutor Attachment. Frontiers in Psychology, 11 (October), 1–5. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2020.576713

Topál, J., Miklósi, Á., Csányi, V., & Dóka, A. (1998). Attachment behaviour in the dogs: a new application of the Ainsworth’s Strange Situation Test. Journal of Comparative Psychology, 112(3), 219–229. https://doi.org/10.1037/0735-7036.112.3.219

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